Concussão Cerebral

Médico ortopedista especialista em joelho e médico do esporte

Concussão é uma perturbação temporária no funcionamento do cérebro, como resultado de um movimento repentino e anormal do mesmo, levando a um choque contra a parede do crânio. Pode ocorrer por um golpe direto contra a cabeça ou por um golpe contra outras partes do corpo, levando ao chicoteamento da cabeça. A concussão resulta em uma alteração temporária do funcionamento cerebral, sem que haja qualquer lesão estrutural, e envolve uma série de sinais e sintomas clínicos. Perda da consciência ocorre em apenas 10% dos casos de concussão e em muitos casos é bastante breve, podendo não ser reconhecida.

Sinais e sintomas da concussão cerebral

Os principais sinais e sintomas da concussão cerebral incluem:

  • Sintomas somáticos: dor de cabeça, náuseas, vômitos, sensibilidade a luz ou barulho, problemas de visão.
  • Sintomas cognitivos: problemas de memória, dificuldade de concentração.
  • Sintomas emocionais e comportamentais: irritabilidade, humor instável.
  • Sinais físicos: perda de consciência, confusão, dificuldade em manter contato visual, fala arrastada e lenta.
  • Comprometimento do equilíbrio: tontura, dificuldade para caminhar.
  • Comprometimento cognitivo: reação lentificada, demora para responder a perguntas e não consegue identificar pessoas, local ou data. Também não reconhece situações do jogo, como qual é o adversário ou qual o placar).
  • Perturbações do sono e vigília: sonolência ou insônia.

Diagnóstico clínico

Embora alguns casos de concussão sejam facilmente reconhecidos até mesmo por pessoas leigas e sejam amplamente divulgados na mídia, muitos casos menos exuberantes acabam sem ser reconhecidos mesmo por especialistas. Existem cerca de 60 sintomas reconhecidos de concussão e alguns deles ocorrem de forma tão breve que não chegam a ser avaliados pelo médico na beira do campo.

Em 2017, o zagueiro da Seleção Brasileira de Futebol Miranda sofreu uma concussão após um choque com o goleiro Alison, ainda no primeiro tempo de jogo. Ele continuou em campo e só foi diagnosticado e retirado do jogo no intervalo. Segundo Rodrigo Lasmar, médico da seleção na ocasião, “Ele não apresentou perda de consciência na hora do choque e não pudemos avaliar porque o árbitro não permitiu a nossa entrada em campo. Quando fizemos a avaliação, no intervalo, vimos que havia perda de memória”.

Em 2018, o Goleiro do Manchester United, Karius, levou dois gols em falhas inaceitáveis após choque com o jogador adversário Sérgio Ramos. O jogo continuou e, em avaliação posterior, foi concluído que o goleiro havia apresentado uma concussão.

Alguns atletas apresentam sintomas imediatamente e logo apresentam uma aparente melhora, como foi o caso de Miranda e Karius. Em outros casos, porém, os sintomas podem aparecer apenas tardiamente. Criticamente, não há uma maneira 100% confiável de diagnosticar a concussão objetivamente.

Desafio extra envolve os esportes de combate, onde provocar a concussão do adversário é, de fato, o objetivo principal do lutador. Ainda que as regras indiquem que a luta deve ser interrompida na presença de sinais de concussão por parte de um dos lutadores, mesmo a análise de vídeo feita por especialistas podem não ser conclusiva quanto a ocorrência ou não de concussão.

Exames de imagem

As concussões normalmente não são detectadas por exames como a ressonância magnética ou a tomografia computadorizada e não são recomendadas de forma rotineira em um atleta que sofreu concussão.

Os exames de imagem devem ser solicitados nas seguintes situações:

Sempre que houver suspeita de lesão estrutural intracraniana

  • Perda de consciência por mais de 30 segundos (lembre-se: 90% de todas as concussões ocorrem sem perda da consciência);
  • Comprometimento prolongado do estado de consciência, especialmente se houver qualquer sugestão de deterioração do nível de consciência;
  • Piora dramática dos sintomas;
  • Dor de cabeça severa;
  • Dificuldades de fala ou linguagem, escrita prejudicada, capacidade de ler ou compreender a escrita prejudicada, incapacidade de nomear objetos;
  • Alterações da visão;
  • Negligência ou desatenção com o ambiente, orientação inadequada para pessoa, lugar ou tempo;
  • Perda de coordenação ou perda de controle motor fino (capacidade de realizar movimentos complexos);
  • Dificuldade para engolir e engasgo frequente;
  • Sonolência significativa ou dificuldade para despertar;
  • Piora dos sinais ou sintomas pós-concussão, ou sintoma persistente (mais de 7 a 10 dias).

Tratamento inicial da concussão

Uma vez reconhecida a possibilidade de ter ocorrido uma concussão, a primeira ação a ser feita é o afastamento imediato da prática esportiva, mesmo que isso seja contra a vontade do atleta ou do treinador.

Retornar ao campo de jogo depois de sofrer uma concussão envolve risco significativo. Se um jogador sofre outro golpe na cabeça antes que o cérebro tenha tido a chance de se recuperar da concussão inicial, o dano pode ser exacerbado a tal ponto que pode ser – em raras ocasiões – fatal. Isso é conhecido como Síndrome do Segundo Impacto e acredita-se ser mais comum entre crianças e adultos jovens.

Não há atualmente nenhum tratamento específico para a concussão além do descanso físico e mental – o que significa nenhum esporte, escola, trabalho ou outras atividades que envolvam “trabalho cerebral” significativo até que o atleta se recupere integralmente. Na maior parte das vezes, os sintomas desaparecem após cerca de 10 dias.

A avaliação neuropsicológica

A maior dificuldade para o diagnóstico da concussão é que, para se determinar se o estado mental está alterado, seria importante conhecer qual o estado mental normal do atleta. Par isso, tem sido adotado a avaliação neuropsicológica de rotina em modalidades nas quais o trauma de cabeça é frequente.

A avaliação neuropsicológica é considerada a forma mais sensível de detectar distúrbios na função cerebral associadas à concussão. A National Football League e a National Hockey League instituíram programas sistemáticos de testes neuropsicológicos. São administrados breves testes de atenção, memória e velocidade de processamento de informações aos atletas antes da temporada.

Atletas que sofrem concussões são testados novamente, normalmente dentro de 48 horas da lesão e em intervalos regulares depois. A recuperação para os níveis de base de desempenho normalmente é necessária antes que os atletas sejam autorizados a voltar a jogar.

Retorno esportivo pós concussão

O retorno esportivo deve ser gradual e só deve ser iniciado no momento em que o atleta estiver sem qualquer sinal ou sintoma da concussão. Idealmente, ele deverá passar por uma avaliação especializada incluindo a realização de testes cognitivos.

Na ausência de um profissional capacitado para fazer a avaliação, o atleta deverá passar ao menos sete dias livre de sintomas antes de iniciar o retorno progressivo aos treinos, seguinto as etapas descritas na tabela abaixo.

Será preciso esperar 24 horas para passar por cada uma das fases acima, o que significa ao menos uma semana para o retorno esportivo pleno.

EstágioAtividadeObjetivo
1. Atividades do dia a diaAtividade que não provoquem sintomasRetorno gradual às atividades de trabalho / estudo
2. Exercícios aeróbicos levesCaminhada ou bicicleta estacionária leveAumento da frequência cardíaca
3. Progressão dos exercíciosCorrida e movimentação conforme a demanda do esporteProgressão do movimento
4. Exercícios sem contatoNo caso do futebol, inicia-se treinos com bola, ainda sem contato. Treino de força leveCoordenação e tomada de decisões
5. Atividades de contatoTreino completo. DEVE SER FEITO SEMPRE APÓS A AVALIAÇÃO E LIBERAÇÃO PELO MÉDICOPreparação para o retorno esportivo
6. Retorno competitivoRetorno completo ao esporte 

Caso haja qualquer recorrência dos sintomas, o atleta deverá fazer repouso completo pelas 24 horas seguintes e depois retornar pelo último estágio em que esteve livre de sintomas da concussão.

Retorno ao trabalho / escola

Pacientes com concussão necessitam de repouso não apenas físico, mas também mental. O retorno ao trabalho ou escola não deve ser autorizado na presença de sintomas concussivos. Outras atividades mentais, incluindo o uso do celular e computadores ou mesmo a leitura, também devem ser restritas. No caso de atletas profissionais, não é o momento para ficar discutindo contratos e outras atividades que possam aumentar o estresse.

Com a melhora dos sintomas, o retorno deve ser gradual a estas atividades. Com o retorno, uma queixa comum é a fadiga e dor de cabeça, principalmente no final do dia, o que é um indicativo de que precisa desacelerar o retorno.

Prevenção da concussão

O ponto mais importante no trabalho de prevenção de concussão é o respeito às regras do esporte. Esportes com risco elevado para concussão, incluindo os esportes de combate, o rugby, o futebol americano e o futebol possuem regras específicas tanto para evitar a concussão como para minimizar os efeitos da concussão em um atleta que tenha sofrido a lesão.

Trabalhos educativos devem ser feitos voltados aos atletas (para enfatizar a importância de evitar situações de risco), arbitragem (para garantir o comprimento das regras e punição adequada em casos de lances perigosos) e equipe médica (garantindo-se o pronto reconhecimento e o tratamento adequado, uma vez que a lesão tenha acontecido).

Equipamentos de proteção específicos, como o capacete, podem ser utilizados a depender do esporte.

A escolha do adversário também é um fator a ser considerado em esportes de combate, futebol americano, rugby e hoquei. A concussão pode ser o resultado de jogadores com nível físico e técnico muito diferentes, uma vez que o jogador mais experiente costuma realizar o combate com uma energia maior e com uma técnica mais eficiente, e o jogador menos experiente não será capaz de se proteger adequadamente deste ataque.

A preparação física e, mais especificamente, o fortalecimento da musculatura ao redor do pescoço, é essencial para estes atletas. O pescoço é uma região de grande mobilidade às custas de uma menor estabilidade extrínseca. Atletas com musculatura cervical mais forte apresentam maior capacidade de resistirem a movimentos intempestivos.

Capacete evita a concussão?

Infelizmente, o uso de capacetes não é capaz de prevenir a concussão. A concussão é uma lesão que ocorre devido ao movimento de aceleração e desaceleração do cérebro dentro do crânio e o capacete não é capaz de reduzir este movimento.

Estudos feitos com boxeadores mostram que o risco de concussão é até maior com o uso de capacete e acredita-se que isso aconteça devido a uma tendência do atleta de se proteger menos quando em uso do capacete.

Isso não significa, porém, que o capacete não deva ser utilizado: o capacete não protege contra as concussões, mas protege contra traumas mais graves, incluindo ferimentos e fraturas do crânio.

A maioria dos capacetes tem uma camada externa dura e uma camada interna de espuma ou outro material mais macio. A camada externa é feita para dissipar a força e espalhar o impacto por uma área maior.

Ao invés de criar um ponto central de impacto – o que poderia causar a fratura do crânio ou ferimentos na cabeça – o capacete aumenta a superfície sobre a qual este impacto será distribuído. Ao mesmo tempo, a camada interna reduz o pico de impacto, absorvendo parte da força.

Concussão em esportes específicos

Esportes que envolvem contatos frequentes entre os atletas envolvem risco para a concussão. Entre os esportes de risco devemos incluir os esportes de combate, a futebol, o rugby e o futebol americano. Cada esporte envolve situações específicas de risco para o atleta a serem considerados.

Concussão no Futebol

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Concussão cerebral nos esportes de combate

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Concussão no rugby

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Concussão no futebol americano

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Concussão na infância

concussão na infância

A concussão preocupa na infância devido ao risco de complicações neurológicas futuras decorrentes de traumas repetitivos na cabeça durante a juventude, devido a uma possível perda no rendimento escolar e pela maior vulnerabilidade das crianças a estas lesões.

Esportes com alto risco de trauma na cabeça incluem modalidades de combate (especialmente MMA, Jiu-Jitsu, Taekwondo e boxe), rugby e futebol americano. Ciclismo, principalmente nas modalidades montain bike, down hill e bicicross apresenta alto risco para quedas, podendo levar a traumas na cabeça. Futebol preocupa em relação a jogadas aéreas, tanto pelo trauma da bola contra a cabeça como pelo trauma da cabeça contra o adversário.

Todos estes esportes foram adaptados para o público infantil, de forma a minimizar o risco de traumas na cabeça. Muito se discute se estas modificações são o suficiente para proteger a criança, o que deve ser avaliado caso a caso.

Crianças estão mais vulneráveis a traumas na cabeça, uma vez que possuem técnica esportiva menos apurada. As jogadas aéreas no futebol ou o combate ao adversário em esportes como rugby e futebol americano, se executados com técnica ruim, aumentam o risco de concussão. O risco de quedas da bicicleta também é maior.

Além da questão técnica, a criança está mais vulnerável para a concussão pelo fato de a musculatura do pescoço ser proporcionalmente mais fraca quando comparado ao adulto, dificultando a estabilização e favorecendo o chicoteamento da cabeça após um trauma.

Síndrome do segundo impacto

A síndrome do segundo impacto está associada a um segundo trauma em sequência de um primeiro episódio de concussão. Este segundo trauma pode levar à piora dos sintomas e, eventualmente, inclusive à morte.

O paciente que sofreu uma concussão apresenta maior risco para uma segunda concussão, caso siga praticando seu esporte. Isso porque, nestas condições, suas reações tornam-se lentificadas, piorando sua capacidade de se defender e ficando mais vulnerável a este novo trauma.

Síndrome pós concussão

A síndrome pós concussão se caracteriza pela persistência dos sinais e sintomas da concussão por tempo prolongado, eventualmente por até um ano ou mais. Ocorre na menor parte dos pacientes vítimas de concussão e não está associado à gravidade da lesão inicial, sendo que a maioria destes casos se resolvem entre o quarto e o sexto mês. Alguns poucos indivíduos podem persistir com os sintomas por um ano ou até mais.

Os motivos que levam algumas pessoas a desenvolverem a síndrome pós concussão e outras não é desconhecido, mas mulheres e pacientes mais velhos estão sob maior risco.

Síndrome pós concussão

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Encefalopatia traumática Crônica

A encefalopatia traumática crônica, também conhecida como demência do pugilista, é uma doença neurodegenerativa que causa dano cerebral grave e irreparável como resultado de lesões repetidas na cabeça. O termo Encefalopatia Traumática Crônica tem sido preferido, pelo fato de a doença ser cada vez mais reconhecida em atletas de outras modalidades que envolvem golpes repetitivos contra a cabeça, como o futebol americano, futebol australiano ou rugby.

Bellini, capitão da Seleção Brasileira campeã do mundo em 1958, foi diagnosticado com encefalopatia crônica e atribui-se a isso as cabeçadas frequentes na bola.

Até 30% dos lutadores profissionais de desportos de combate, tais como pugilismo, muay thai, kickboxing e MMA, são acometidos por graus variados da doença. A demência pugilística geralmente se inicia tardiamente na carreira do atleta. A doença ficou muito conhecida com Muhammad Ali, que desenvolveu o quadro parkinsoniano, mas a apresentação é variável e pode envolver problemas comportamentais, de humor e de pensamento.

Os sintomas tendem a piorar com o tempo e podem resultar em demência.

Os sintomas variam conforme as áreas mais acometidas do cérebro, mas podem envolver:

  • Problemas na fala
  • Dificuldade para engolir alimentos
  • Dor de cabeça crônica
  • Demência ou diminuição da capacidade mental
  • Confusão, desorientação
  • Depressão
  • Problemas de memória
  • Perda do equilíbrio, marcha instável
  • Parkinsonismo
  • Comportamentos inapropriados ou explosivos, incluindo ciúme patológico ou paranóia. Casos de suicídio e assassinatos já foram atribuídos à demência pugilística.

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