Existem diversos programas e protocolos com eficácia comprovada para a prevenção do Ligamento Cruzado Anterior. O mais conhecido deles é o FIFA 11+ , desenvolvido para a prevenção de um conjunto de lesões comuns no futebol, mas que tem foco considerável no Ligamento Cruzado Anterior. Estudos mostram que o FIFA 11+ é capaz de reduzir em até 50% as lesões do Ligamento Cruzado Anterior.
Estes programas têm como foco a correção de fraquezas e desequilíbrios musculares e de padrões de movimento que favorecem a ocorrência da lesão do Ligamento Cruzado Anterior.
A justificativa do FIFA 11+ é que o futebol envolve padrões de movimento e de sobrecarga comuns, que fazem com que muitas das deficiências sigam um padrão que se repete entre os atletas da modalidade. Os exercícios do FIFA 11+ buscam, então, compensar estas deficiências.
A vantagem do programa desenvolvido pela FIFA é que ele é fácil de ser aplicado e não depende do acompanhamento de profissionais especializados ou de uma avaliação prévia do atleta, o que limitaria sua aplicabilidade em larga escala.
A eficácia dos programas de prevenção aumenta muito, porém, quando são desenvolvidos de forma individualizada, com base em uma avaliação previa das necessidades de cada atleta. Testes de dinamometria manual ou isocinética e avaliação de certos padrões de movimento devem ser considerados para isso.
Clubes esportivos profissionais principalmente no futebol, fazem isso de forma rotineira com seus atletas. Programas semelhantes estão disponíveis em clínicas especializadas para o atleta recreativo, independentemente do nível de competição.
Fatores de risco para a lesão do Ligamento Cruzado Anterior
Os fatores de risco para lesões do Ligamento Cruzado Anterior foram amplamente estudados e podem ser divididos em dois grupos:
- Fatores intrínsecos: são aqueles próprios do atleta, incluindo fatores anatômicos, desequilíbrios e fraquezas musculares, mobilidade das articulações;
- Fatores extrínsecos: fatores que não estão diretamente relacionados ao corpo do atleta, incluindo a carga de treinamento, equipamentos esportivos, instalações esportivas e fatores climáticos.
Em seguida, estes fatores podem ser divididos em outros dois grupos, os modificáveis e os não modificáveis, conforme a tabela abaixo
Modificáveis | Não modificáveis | |
---|---|---|
Intrínsecos | Desequilíbrios musculares Fraqueza Restrições articulares |
Período do ciclo menstrual Anatomia individual (deformidades angulares do joelho, intercôndilo estreito, entre outros) Idade Lesões prévias Gênero feminino |
Extrínsecos | Carga de treino Tipo de grama Tipo de chuteira |
Fatores climáticos |
Os programas de prevenção devem focar nos fatores de risco modificáveis, tanto intrínsecos como extrínsecos.
Fatores extrínsecos modificáveis
Calçado esportivo
Os calçados esportivos exercem forte influência no desenvolvimento das lesões do Ligamento Cruzado Anterior. A maior parte das lesões acontecem quando o atleta prende o pé no chão e gira o corpo sobre o joelho. Assim, quando há uma forte aderência entre o calçado e o piso, o risco de lesões é maior.
Podemos dizer, desta forma, que a aderência do calçado ao solo não deve ser nem baixa (para que não atrapalhe o gesto esportivo) e nem excessiva (para que não aumente o risco de lesões no joelho e tornozelo). No caso do futebol, os tipos de travas nas chuteiras precisam ser considerados.
Diferentes tipos de travas podem ser necessários de acordo com a superfície em que se está jogando (grama natural ou sintética) ou fatores climáticos, como chuva.
Superfície de treino
A superfície em que se pratica a atividade esportiva pode produzir graus variados de tração sobre o calçado. Daí a importância de se escolher o calçado adequado para cada superfície. No futebol, muito se discute sobre o risco de lesão na grama artificial ou sintética.
Os primeiros modelos de grama sintética levaram a uma incidência inaceitavelmente alta de lesões do Ligamento Cruzado Anterior. Frente a isso, gramas com menor potencial de tração foram desenvolvidos, e hoje há disponível no mercado modelos de grama sintética que trazem uma segurança muito maior.
Da mesma forma, existem diferentes espécies de grama natural, o que também tem influência na incidência de lesões.
Fatores intrínsecos modificáveis
Fraquezas e desequilíbrios musculares
Durante a prática esportiva, muitas vezes o corpo é levado para posições de desequilíbrio. A musculatura deve, então, entrar em ação, buscando recuperar o equilíbrio. Quando a musculatura não responde adequadamente, o joelho pode falhar e levar a uma lesão do Ligamento Cruzado Anterior.
Ter uma musculatura forte e compatível com a exigência que o atleta tem em sua prática esportiva é fundamental, mas tão importante quanto a força absoluta é ter um bom equilíbrio entre os diferentes grupos musculares e entre as duas pernas.
Estudos demonstram que um desequilíbrio de força superior a 10% de uma perna em relação à outra já leva a um aumento no risco de lesões do Ligamento Cruzado Anterior, e que quanto maior o desequilíbrio, maior o risco.
Além disso, uma relação de força de aproximadamente 60% entre os extensores e os flexores do joelho é considerada ideal. Estes desequilíbrios podem ser aferidos por testes como a dinamometria manual ou isocinética.
Vale aqui considerar ainda que, para que o joelho funcione adequadamente, todas as articulações devem funcionar em harmonia. Assim, é importante que se faça uma avaliação física completa, incluindo mobilidade, estabilidade e força em todas as articulações, não apenas no joelho.
Padrão de movimento e controle neuromuscular
Muitos atletas até possuem uma musculatura forte e equilibrada, mas não apresentam uma boa coordenação do movimento e o gesto esportivo acaba prejudicado. A lesão do Ligamento Cruzado anterior está especialmente ligada a uma incapacidade em manter um bom alinhamento do membro inferior em movimentos como salto e aterrissagem de saltos ou até mesmo na corrida.
O joelho, nestes atletas, tem uma tendência de entrar para dentro, em um erro de movimento que geralmente se inicia pelo quadril, ao qual se denomina de valgo dinâmico. Isso porque, ao olhar o atleta de frente, dá-se a falsa aparência de deformidade do joelho em valgo, ou “em X”. O valgo dinâmico facilita os movimentos torcionais e estudos já demonstraram que está associado a uma maior incidência de lesão do Ligamento Cruzado Anterior.
Fadiga e controle de carga
A fadiga desempenha um papel fundamental no risco de lesões. Uma musculatura fadigada não responde bem aos comandos do atleta, fazendo com que este entre em uma situação de desequilíbrio mais facilmente e tenha maior dificuldade para recuperar o equilíbrio.
Isso justifica o fato de que a maior parte das lesões acontecem na parte final dos treinos ou competições, quando o atleta está mais cansado.
Início de temporada (quando o atleta ainda está vindo de uma fase de inatividade) e final de temporada (quando está fadigado), bem como o retorno esportivo pós lesão são outras situações que aumentam o risco para lesões do Ligamento Cruzado Anterior. Otimizar a recuperação pós-treino, pelo mesmo motivo, é uma parte fundamental da prevenção das lesões do Ligamento Cruzado Anterior.
Um programa eficaz de gerenciamento de carga ajuda a reduzir o risco de lesões do Ligamento Cruzado Anterior, detectando a fadiga excessiva, identificando suas causas e ajustando os períodos de recuperação, treinamento e competição, com base nos níveis atuais de fadiga do atleta.
Os grandes clubes realizam este monitoramento diariamente, usando diversos métodos e sistemas para isso, como protocolos específicos para fadiga, monitoramento da frequência cardíaca ou mesmo por meio de testes bioquímicos.
No caso de atletas recreativos, o monitoramento tende a ser menos rígido, mas muitas vezes uma simples consulta e avaliação podem indicar uma carga inadequada de treinamento.