Ao realizarmos uma atividade física, o exercício provoca micro lesões na musculatura. Estas lesões desencadeiam uma resposta inflamatória local, fundamental para que a musculatura se recupere. Este processo de lesão e recuperação é que faz com que o músculo fique gradativamente maior e mais forte.
A inflamação leva a um quadro de desconforto e tensão muscular que, dentro de certos limites, deve ser considerada normal após uma atividade física. Geralmente se inicia dentro de 6 a 8 horas e atinge sua intensidade máxima entre 24 a 48 horas após o exercício.
O excesso de exercícios, por outro lado, pode provocar um dano muscular e inflamação além do desejável. A inflamação em excesso leva a um aumento na liberação de radicais livres que, por sua vez, pode provocar um dano muscular secundário.
Quando o atleta chega a este ponto, a atividade se torna prejudicial do ponto de vista físico. Perpetuando-se esta situação ao longo dos treinos, o atleta piora seu condicionamento físico, perde desempenho e fica mais vulnerável a lesões.
Atletas de alto rendimento costumam atuar muito próximo dos limites de suas condições físicas, de forma que, eventualmente, este limite acaba sendo ultrapassado. A dor e a tensão muscular pós-treino é uma ótima referência para isso e, quando em excesso, é um indicador de que é preciso colocar o pé no freio.
Infelizmente, porém, não existe um parâmetro objetivo que indique até que ponto o exercício está levando a adaptações positivas e quando ele está se tornando prejudicial.
Ácido lático
O ácido lático é um produto do metabolismo celular da glicose produzido durante as atividades físicas intensas, quando não há disponibilidade de oxigênio suficiente nas células para suprir a demanda da musculatura. O excesso de ácido lático provoca cansaço e dores musculares e foi, por muito tempo, responsabilizado pela dor muscular tardia no esporte.
Estudos mostram, porém, que o ácido lático é eliminado dos músculos em até 1 a 2 horas após o término do treino. Assim, não tem como ser responsabilizado por uma dor que tem seu pico de 24 a 48 horas após a atividade. A dor muscular pós-treino, portanto, está muito mais relacionada à microlesão muscular e ao processo inflamatório decorrente deste dano muscular do que ao acúmulo do ácido lático.
Quando a dor deve ser considerada “anormal”?
Ainda que a dor e o desconforto de leve a moderada intensidade devam ser considerados normais, quando excessivos eles estarão sinalizando que a atividade física está sendo prejudicial. São sinais de uma atividade física excessiva:
- Dor que impede a pessoa de realizar as atividades do dia a dia ou do trabalho.
- Desconforto persistente por mais de 7 dias.
Em casos graves, os músculos podem quebrar tanto, que o atleta pode ficar muito doente e causar danos sérios aos rins. Em casos extremos, podem levar, inclusive, a risco de vida. Procure atendimento médico imediato se tiver alguma das seguintes situações após um treino ou atividade muito além do habitual:
- Dor insuportável;
- Membros excessivamente inchados;
- Urina de cor escura ou redução da produção de urina.
É possível prevenir a dor muscular pós-treino??
A dor muscular pós-treino está diretamente relacionada a uma carga excessiva de exercícios. Pode acometer atletas em todos os níveis, desde o profissional, até aqueles que buscam largar o sedentarismo.
A diferença é que, para uma pessoa sedentária, uma caminhada mais longa já poderá ser excessiva. No caso de um maratonista, isso poderá acontecer caso ele venha a correr uma ultramaratona.
Nos atletas recreativos, uma boa orientação profissional para montar o programa de treinos costuma ser o suficiente, já que a carga de treino tende a ser mais conservadora, longe dos limites do que seria prejudicial.
Os atletas profissionais ou de alto rendimento, por sua vez, buscam treinar no limite de suas capacidades físicas. Assim, o risco para que este limite seja ultrapassado é bem maior.
Neste caso, além de um bom planejamento de treinos, é recomendável que se lance mão dos diversos recursos disponíveis para controle de carga de treino, incluindo escores subjetivos de fadiga, controle da frequência cardíaca de repouso, entre outros.
O excesso de exercício pode acontecer de forma pontual, como ao realizar uma trilha em uma viagem ou ao fazer uma corrida de rua além daquilo para o qual estava preparado, ou pode ser decorrente do esforço cumulativo, quando o intervalo entre dois treinos consecutivos torna-se insuficiente para uma recuperação completa.
Assim, otimizar a recuperação pós-treino é fundamental para atletas que realizam treinos intensos e frequentes.
O retorno aos treinos ou competição, seja após férias ou após uma lesão, precisa de uma atenção especial. Um mês de afastamento das atividades físicas pode levar a até 30% de perda de força, de forma que, se tentar acelerar demais este retorno, a sobrecarga e o risco de lesões aumentam.
A dor muscular pós-treino é um indício de que o retorno está sendo muito rápido. Para evitar isso, o retorno deve ser sempre progressivo, com aumento não superior a 15% da carga de treino por semana.
Como diferenciar a dor muscular pós-treino de uma lesão muscular?
Tanto a dor muscular pós-treino como as lesões musculares são comuns em esportes que envolvem rápidas acelerações, desacelerações e mudanças de direção.
Diferenciar estas duas condições é fundamental, já que o tratamento será completamente diferente. Clinicamente, devemos considerar os seguintes aspectos para realizar esta diferenciação:
- Início da dor: A dor muscular pós-treino tipicamente se inicia entre duas e 24 horas após o exercício, atingindo seu pico após 36 horas. Já as lesões musculares provocam dor quase que imediatamente após a lesão.
- Duração da dor: Na maioria dos casos, a dor muscular pós-treino se tornará menos intensa em dois ou três dias. Já as lesões musculares tendem a demorar mais para se recuperar.
- Característica da dor: Habitualmente, a dor muscular pós-treino tende a ser mais difusa, não tão bem localizada. Nas lesões musculares, é possível se apontar com o dedo o local da dor.
Na prática, esta diferenciação não é tão simples, mesmo para médicos acostumados com as lesões no esporte. Assim, a avaliação de um médico especialista será sempre recomendável, principalmente quando a dor não estiver dando sinais de melhora após 3 a 5 dias da lesão.
Como tratar a dor muscular pós-treino?
Diversas técnicas já foram descritas para otimizar a recuperação pós-treino, e mais especificamente a dor muscular pós-treino: agulhamento, imersão em gelo, massagem esportiva, ventosas, câmara hiperbárica entre outras. A eficácia de cada uma destas modalidades é bastante controversa no meio da medicina e do treinamento esportivo.
De fato, são três os principais fatores envolvidos na recuperação pós-treino e que, comprovadamente, atuam no sentido de uma recuperação mais eficaz: alimentação, hidratação e sono. Treinos regenerativos leves podem também contribuir para isso.
A dor muscular, quando excessiva, indica que o treino foi também excessivo. Nestes casos, ao invés de se abandonar a atividade física, é importante que se faça um programa de treinamento mais progressivo, preparando o organismo para aquela carga de treino.
Gradativamente, o organismo será capaz de suportar uma carga cada vez maior, mas o aumento no esforço físico deve ser feito respeitando-se sempre o limite da dor.